RELOGIO

quinta-feira, 8 de dezembro de 2016

A importância de Gilberto Freyre para a construção da Nação Brasileira – Parte II

Autor: Roberta Fragoso 

Como vimos na primeira parte deste artigo, Freyre rompeu com velhos pensamentos preconceituosos e reducionistas e aclamou a participação do negro e do índio no processo de formação do caráter nacional.
Na obra Casa-Grande & Senzala, Gilberto revelou a presença do negro em diversas facetas da nossa cultura, como na música, na dança, no vocabulário e na culinária. De igual maneira procedeu com os índios, explicando a origem do nosso hábito de dormir em redes, de se pintar, de tomar banho diariamente, bem como a valorização das ervas, da cor vermelha e dos remédios caseiros.
Em vez de aclamação social, as obras de Freyre despertaram ondas de protestos em todas as camadas. Por conta da linguagem vulgar, recebeu o título de pornógrafo do Recife e a Igreja Católica repudiava constantemente as suas publicações, consideradas atentatórias à moral e aos bons costumes. Foi tachado de anticatólico, comunista, anarquista, agitador, antilusitano, africanista, dentre outras alcunhas.
O pensamento exposto por Gilberto Freyre encontra resistências até hoje, aparentemente pelo fato de não ter situado o problema racial no Brasil como um problema exclusivamente de cor ou por não ter sido partidário da revolta dos negros contra os brancos. O que torna as críticas ainda mais pitorescas, decerto, é o fato de serem formuladas, em sua maioria, por representantes do movimento negro, justo a cor a que Gilberto fez questão de homenagear, por haver lhe conferido importância nunca dantes exposta com tanta franqueza. Nessa linha, bem demonstrou Darcy Ribeiro, no texto Gilberto Freyre — Uma introdução à Casa-Grande & Senzala:
“Com efeito, o que mais provocou a sensação e surpresa aos primeiros leitores de Casa-Grande & Senzala foi o negrismo de Gilberto Freyre. Ele vinha dizer — ainda que em linguagem meio desbocada, mas com todos os ares de cientista viajado e armado de erudições múltiplas — que o negro — no plano cultural e de influência na formação social do Brasil — fora não só superior ao indígena (…) mas até mesmo ao português, em vários aspectos da cultura material e moral, principalmente da técnica e da artística”.
Causa certa perplexidade o fato de alguns dos intelectuais do movimento negro acusarem Freyre de haver difundido no Brasil o mito da democracia racial, qual seja, a lenda de que no País o preconceito racial não existe e que as relações entre as raças são perfeitas e harmônicas. Na verdade, esclareça-se, em nenhuma passagem do livro Casa-Grande & Senzala Gilberto usou a expressão democracia racial. Sobre isso, o antropólogo Hermano Vianna ousou dizer que há, no País, um mito sobre o mito da democracia racial.
Nessa linha, a vida de Gilberto Freyre, após a obra Casa-Grande passou a ser um eterno explicar-se. Incansavelmente, repetia que não fora criador do mito da democracia racial e que o fato de seus livros terem reconhecido a intensa miscigenação entre as raças no Brasil não significava decerto a ausência de preconceito ou de discriminação. Exemplo de desabafo contrário à acusação de ter criado a idéia de equilíbrio racial no Brasil pode ser extraída da entrevista realizada com o autor em 15/3/1980. À pergunta: “Até que ponto nós somos uma democracia racial?”, formulada pela jornalista Lêda Rivas, Freyre respondeu:
“(…) Democracia política é relativa. (…). Sempre foi relativa, nunca foi absoluta(…).Democracia plena é uma bela frase (…) de demagogos, que não têm responsabilidade intelectual quando se exprimem sobre assuntos políticos. (…). Os gregos, aclamados como democratas do passado clássico, conciliaram sua democracia com a escravidão. Os Estados Unidos, que foram os continuadores dos gregos como exemplo moderno de democracia no século XVIII, conciliaram essa democracia também com a escravidão. Os suíços, que primaram pela democracia direta, até há pouco não permitiam que mulher votasse. São todos exemplos de democracias consideradas, nas suas expressões mais puras, relativas. (…). O Brasil (…) é o país onde há uma maior aproximação à democracia racial, quer seja no presente ou no passado humano. Eu acho que o brasileiro pode, tranqüilamente, ufanar-se de chegar a este ponto. Mas é um país de democracia racial perfeita, pura? Não, de modo algum. Quando fala em democracia racial, você tem que considerar [que] o problema de classe se mistura tanto ao problema de raça, ao problema de cultura, ao problema de educação. (…) Isolar os exemplos de democracia racial das suas circunstâncias políticas, educacionais, culturais e sociais, é quase impossível. (…). É muito difícil você encontrar no Brasil [negros] que tenham atingido [uma situação igual à dos brancos em certos aspectos…]. Por quê? Porque o erro é de base. Porque depois que o Brasil fez seu festivo e retórico 13 de maio, quem cuidou da educação do negro? Quem cuidou de integrar esse negro liberto à sociedade brasileira? A Igreja? Era inteiramente ausente. A República? Nada. A nova expressão de poder econômico do Brasil, que sucedia ao poder patriarcal agrário, e que era a urbana industrial? De modo algum. De forma que nós estamos hoje, com descendentes de negros marginalizados, por nós próprios. Marginalizados na sua condição social. […]. Não há pura democracia no Brasil, nem racial, nem social, nem política, mas, repito, aqui existe muito mais aproximação a uma democracia racial do que em qualquer outra parte do mundo”.
E ao prefaciar a obra Religião e Relações Raciais, de René Ribeiro, Gilberto Freyre mais uma vez afirmou:
“Tão extremada é tal interpretação como a dos que pretendam colocar-me entre aqueles sociólogos ou antropólogos apenas líricos para quem não houve jamais entre os portugueses, nem há entre brasileiros, preconceito de raça sob nenhuma forma. O que venho sugerindo é ter sido quase sempre, e continuar a ser, esse preconceito mínimo entre portugueses — desde o contato dos mesmos como os negros e da política de assimilação, do Infante – e brasileiros, quando comparado com as outras formas cruas em vigor entre europeus e entre outros grupos. O que daria ao Brasil o direito de considerar-se avançada democracia étnica como a Suíça se considera — e é considerada — avançada democracia política, a despeito do fato, salientado já por mais de um observador, de haver entre os suíços não raros seguidores de (…) idéias políticas de antidemocracia”.
O fato de não haver se filiado à corrente maniqueísta esposada por alguns dos líderes negros talvez tenha custado muito caro ao sociólogo. Mas a verdade é que Freyre bem conhecia a realidade estadunidense, a tal ponto de não poder associá-la, nem aproximá-la, da realidade brasileira. Usualmente Freyre tecia considerações sobre as diferenças entre o sistema de segregação institucionalizada, operada nos Estados Unidos e o racismo praticado no Brasil. Nesses termos, afirmava:
“Não é que inexista preconceito de raça ou de cor conjugado com o preconceito de classes sociais no Brasil. Existe. Mas ninguém pensaria em ter Igrejas apenas para brancos. Nenhuma pessoa no Brasil pensaria em leis contra os casamentos inter-raciais. Ninguém pensaria em barrar pessoas de cor dos teatros ou áreas residenciais da cidade. Um espírito de fraternidade humana é mais forte entre os brasileiros que o preconceito de raça, cor, classe ou religião. É verdade que a igualdade racial não se tornou absoluta com a abolição da escravidão. (…). Houve preconceito racial entre os brasileiros dos engenhos, houve uma distância social entre o senhor e o escravo, entre os brancos e os negros (…). Mas poucos aristocratas brasileiros eram rígidos sobre a pureza racial, como era a maioria dos aristocratas anglo-americanos do Velho Sul”.

A importância de Gilberto Freyre para a construção da Nação Brasileira – Parte I


A primeira fase de estudos sobre as relações raciais no País ficou decididamente marcada pela genialidade de Gilberto Freyre. Isto porque, a despeito de vários outros autores contemporâneos ou anteriores a Freyre terem desenvolvido estudos sobre as relações raciais no Brasil, a magnitude do trabalho freyriano merece uma reflexão autônoma e pontual.
Revolucionário, criativo, inovador, os adjetivos são insuficientes para resumir essa personalidade ímpar, que nadou contra a corrente ao tentar desenvolver a idéia da miscigenação como a nota essencial a distinguir o povo brasileiro. Antes dessa etapa, a maior parte dos estudos sobre o tema no Brasil se baseava em premissas pseudocientíficas sobre a inferioridade dos negros.
A importância de Casa-Grande & Senzala não pode ser observada exclusivamente a partir de seu conteúdo. É que além de ter se constituído em um livro revolucionário, tanto por causa do enfoque dado a temas muitas vezes já discutidos no Brasil, tanto pela adoção de uma linguagem comum, vulgar até, o fato é que as maiores contribuições que a obra trouxe à cultura nacional foram a de libertar o futuro do País das previsões pessimistas até então realizadas e a de inserir o negro no papel de sujeito — em vez de mero objeto — na formação do povo brasileiro, junto ao índio e ao português.
O ensaio procurou resgatar a auto-estima do povo brasileiro, ao analisar a diversidade da formação social como motivo de orgulho e força. Em vez de reservar o destino do Brasil ao subdesenvolvimento, como era lugar comum entre os escritores da época, Gilberto Freyre inovou, ao afirmar o caráter positivo da mistura. Desse modo, libertou-nos das amarras que impediam a expectativa de um Brasil melhor. A obra possui o mérito de procurar redimir os brasileiros do complexo de terem nascido no País, ao tempo em que analisa a influência das raças na formação da sociedade como algo positivo e peculiar do Brasil. O texto, na verdade, é uma apologia à miscigenação e, pela primeira vez, alternou o papel comumente destinado ao negro na literatura de então, elevando-o à condição de protagonista, e não mero espectador dos acontecimentos. Nesse sentido, tais foram as palavras de Freyre: “Todo brasileiro, mesmo o alvo, de cabelo louro, traz na alma, quando não na alma e no corpo (…) a sombra, ou pelo menos a pinta, do indígena e do negro. Na ternura, na mímica excessiva, no catolicismo em que se deliciam os nossos sentidos, na música, no andar, na fala, no canto de ninar menino pequeno, em tudo que é expressão sincera de vida, trazemos quase todos a marca da influência negra”.
Para se compreender o mérito deste majestoso estudo sobre os trópicos, é preciso observar o contexto que precedeu a publicação. Os livros anteriores à Casa-Grande & Senzala revelavam uma extrema melancolia, os autores enfadonhamente repetiam o desastre do destino brasileiro e creditavam a derrota especialmente à miscigenação entre as três raças. Garantiam que o resultado da composição do que acreditavam ser o índio preguiçoso, o negro inferior e o português ignorante não poderia ser diferente do que a criação de um povo mole, lento, subdesenvolvido, incapaz de superar as adversidades e de construir uma nação vigorosa. Retratavam um Brasil miserável, destinado ao subdesenvolvimento e ao fracasso.
Para citar apenas alguns exemplos, podemos começar a situar o contexto anterior à Casa-Grande a partir da publicação de A poesia popular no Brasil, de Sylvio Romero. Um dos fundadores da Escola do Recife e conterrâneo de Tobias Barreto, assim se expressou o sergipano: “É uma vergonha para a ciência do Brasil que nada tenhamos consagrado de nossos trabalhos ao estudo das línguas e das religiões africanas. Quando vemos homens, como Bleek, refugiar-se dezenas e dezenas de anos nos centros da África somente para estudar uma língua e coligir uns mitos, nós, que temos o material em casa, que temos a África em nossas cozinhas, como a América em nossas selvas e a Europa em nossos salões, nada havemos produzido neste sentido! É uma desgraça. Bem como os portugueses estanciaram dois séculos na Índia e nada ali descobriram de extraordinário para a ciência, deixando aos ingleses a glória da revelação do sânscrito e dos livros brahmínicos, tal nós vamos levianamente deixando morrer os nossos negros da Costa como inúteis, e iremos deixar a outros o estudo de tantos dialetos africanos, que se falam em nossas senzalas! O negro não é só uma máquina econômica, ele é antes de tudo um objeto de ciência”.
Ainda no século XIX, José Bonifácio, na obra Projetos para o Brasil, observou os índios como um povo “naturalmente melancólico e apático, estado de que não sai senão por grande efervescência das paixões, ou pela embriaguez; a sua música é lúgubre, e sua dança mais ronceira e imóvel que a do negro”.
E Paulo Prado, em Retratos do Brasil, publicado originariamente em 1928, insurgiu-se contra a consciência de que o País formava um paraíso tropical e de alegria e afirmou ser o Brasil uma das nações mais atrasadas do continente, empestada por vícios, com uma elite despreparada e ignorante. E assim aduziu: “A Colônia, ao iniciar-se o século de sua independência, era um corpo amorfo, de mera vida vegetativa, mantendo-se apenas pelos laços tênues da língua e do culto. População sem nome, exausta pela verminose, pelo impaludismo e pela sífilis, tocando dois ou três quilômetros quadrados a cada indivíduo, sem nenhum ou pouco apego ao solo nutridor; país pobre sem o auxílio humano, ou arruinado pela exploração apressada, tumultuária e incompetente de suas riquezas minerais; cultura agrícola e pastoril limitada e atrasada (…). Indigência intelectual e artística completa, em atraso secular, reflexo apagado da decadência da mãe-pátria; facilidade de decorar e loquacidade derramada, simulando cultura; vida social nula porque não havia sociedade, com as mulheres reclusas como mouras ou turcas; vida monótona e submissa, sem os encantos que a poetizam…”.
Nas páginas finais do livro, arremata: “Dos agrupamentos humanos de mediana importância, o nosso país é talvez o mais atrasado. O Brasil, de fato, não progride: vive e cresce, como cresce uma criança doente, no lento desenvolvimento de um corpo mal organizado (…). A cultura intelectual não existe, ou finge existir em semiletrados mais nocivos do que a peste. Não se publicam livros porque não há leitores, não há leitores porque não há livros. (…). Um vício nacional, porém, impera: o vício da imitação. Tudo é imitação, desde a estrutura política em que procuramos encerrar e comprimir as mais profundas tendências da nossa natureza social, até o falseamento das manifestações espontâneas do nosso gênio criador”.
E ainda há mais. Outros escritos revelaram, ainda, a vontade de por critérios aparentemente científicos procurar comprovar a inferioridade da raça negra. Nesse sentido, J. B. de Sá Oliveira, quando escreveu Craniometria Comparada das Espécies Humanas na Bahia sob o ponto de vista Evolucionista e Médico-legal, em 1895 e ainda o médico legista Nina Rodrigues, com a obra Os Africanos no Brasil, recentemente reeditado, parte do estudo desenvolvido pelo autor entre 1890 a 1905, que se intitulara O Problema da Raça Negra na América Portuguesa.
Em 1932, Homero Pires publicou os manuscritos do médico legista Nina Rodrigues, que havia falecido antes de terminar o livro. Surgiu, assim, a obra Os Africanos no Brasil. Acompanhado de grande interesse nacional, o texto é considerado, até hoje, um dos grandes estudos sobre a influência dos negros na formação do povo brasileiro.
Em sua pesquisa, Nina Rodrigues difundiu a idéia de que a maior desgraça brasileira havia sido a miscigenação das raças, o que debilitara o povo, tornando-o fraco. Considerou que o negro é uma espécie inferior, com propensões genéticas à criminalidade e que a participação deste como elemento étnico do Brasil garantiu-nos posição de extrema desvantagem em comparação com outros países. Não satisfeito, citou ainda o exemplo dos Estados Unidos, onde apesar de também haver negros, a miscigenação não somente era desestimulada, como controlada por parte do Estado. E aduziu: “Se conhecemos homens negros ou de cor de indubitável respeito, não há de obstar esse fato o reconhecimento desta verdade — que até hoje não puderam os Negros se constituir em povos civilizados”. Em outro momento, afirmou: “A Raça Negra no Brasil, por maiores que tenham sido os seus incontáveis serviços à nossa civilização, por mais justificadas que sejam as simpatias de que a cercou o revoltante abuso da escravidão, por maiores que se revelem os generosos exageros dos seus turiferários, há de constituir sempre um dos fatores da nossa inferioridade como povo”. E por fim concluiu: “O que importa ao Brasil determinar é o quanto de inferioridade lhe advém da dificuldade de civilizar-se por parte da população negra (…)”.
A despeito do conteúdo preconceituoso e discriminatório do livro, o prestígio do autor pode ser sentido até hoje, na medida em que sua obra foi reeditada recentemente e seu nome intitula hospital, museu, instituto médico legal, e até uma cidade no Maranhão, dentre outras instituições.
Outro famoso autor da época, Oliveira Vianna, ao publicar Raça e Assimilação, em 1932, acreditava que a miscigenação com o povo africano fora um grande mal para o Brasil, porque enfraquecera o povo brasileiro. Destacou: “Sob o ponto de vista biológico, o estrangeiro, mesmo naturalizado, é sempre um organismo em crise de adaptação (…). Ora, nem sempre o seu organismo tem a plasticidade adaptativa que se refletem nas variações dos índices de morbidade, de mortalidade, de longevidade de cada indivíduo, de cada raça, de cada etnia”. E continuou: “Estes, entretanto, nos chegam, civilizados ou semi-bárbaros (…), carregando usos estranhos, costumes, tradições, modalidades folclóricas de todo o gênero; em suma, formas novas de civilização, que, entrando em conflito entre si ou com a nossa, substituindo-se, superpondo-se ou interdifundindo-se, estão alterando profundamente as camadas tradicionais da nossa sedimentação cultural”.
E é nesse contexto em que se reafirmava a mediocridade do povo, a insipiência das instituições e a fraqueza das relações sociais que surgiu Gilberto Freyre, com uma ousadia de percepção que o tornou praticamente um redescobridor do Brasil.

Blowing In The Wind (Live On TV, March 1963)

Tô aqui juntando os documentos para me aposentar de acordo com a nova regra da previdência social, só falta a certidão de óbito

Previdência vai matar o pobre, a mulher e o camponês


Gabas: reforma recria o trabalho infantil de forma brutal!

PHA: Eu vou conversar agora com Carlos Gabas, que foi Ministro da Previdência duas vezes no Governo Lula e uma vez no Governo Dilma. Ministro, qual é o impacto dessa medida da Reforma da Previdência apresentada pelo Governo e que faz com que só receba a Previdência integral quem completar 49 anos de contribuição? 
Carlos Gabas: O impacto é muito pesado, muito forte sobre os trabalhadores, especialmente aqueles mais pobres, que têm menor qualificação, menor salário e que começam muito cedo no mercado de trabalho. A transição que foi colocada é muito dura. Na verdade, não teve nenhuma discussão com a sociedade. Ela abrange de uma maneira muito ampla o universo previdenciário. O que tem que ficar bem claro é que nós não estamos falando de uma parcela rica da população, mas de pessoas pobres. A Previdência paga salários de até R$ 5.189. Eu não posso dizer que uma família que tem essa renda é rica. E, na sua grande maioria, mais de dois terços dos benefícios da Previdência, dos mais de 34 milhões de benefícios, são de um salário mínimo: então, estamos falando de gente pobre! Isso significa que, ao fazer uma modificação dura como essa, você está penalizando a parte mais pobre da população.
PHA: Você podia dar uma ideia do impacto das regras de transição ? Lembrando que  a proposta apresentada institui como regra de transição o pedágio de 50% sobre o tempo de contribuição para quem está perto de se aposentar, – homens acima de 50 anos e mulheres acima de 45 –, o que põe fim à fórmula 85/95.
CG: Nós trabalhávamos, primeiro, com uma compreensão de que nós estamos lidando com gente pobre. Segundo, que é uma política social que distribui renda, que trabalha com o bem-estar da sociedade. Então, qualquer mudança de regra é sensível para as pessoas. A transição de uma regra para outra deve ser suave. Vamos pegar uma trabalhadora de 44 anos que já tinha 29 de contribuição - faltava um para ela se aposentar: ela vai se aposentar agora só aos 65 anos de idade! É uma virada de mesa muito grande para cima de inúmeros trabalhadores. 
PHA: Vamos falar, então, da questão da idade mínima, que pretende institui 65 anos para todos darem entrada no pedido de aposentadoria e, além disso, o trabalhador tem de ter, nessa idade, ao menos 25 anos de contribuição. Qual o impacto disso?
CG: Primeiro, ele [o impacto] é muito mais forte para as mulheres. A mulher, por todo o conjunto de situações e dificuldades que ela enfrenta na sociedade - discriminação no trabalho, na renda, em casa, parcela de responsabilidade muito maior na criação dos filhos, enfim, uma dupla, tripla jornada... Por isso é que a Constituição previa um tratamento diferenciado para as mulheres. A regra proposta trata todo mundo igual. E mais: ela impõe uma idade mínima de 65 anos que não é fixa: cada vez que o IBGE detectar o aumento da expectativa de sobrevida, há um artigo na PEC que obriga que essa idade suba de acordo com essa sobrevida. Só para você ter uma ideia: nos últimos 10 anos, a expectativa de sobrevida cresceu 4,6 anos. Se isso estivesse vigente lá atrás, a idade mínima já seria quase 70 anos.  
PHA: Vamos tocar agora num outro ponto que, aparentemente, chocou até o Paulinho da Força, que, como se sabe, trabalhou entusiasmadamente pelo Golpe: é a questão da mudança no cálculo. O valor do benefício será determinado a partir do equivalente a 51% do valor médio das 80 remunerações mais elevadas registradas desde 1994, acrescido de 1 ponto percentual para cada ano de contribuição. Isso, na sua opinião, vai significar que tipo de correção do valor?
CG: Há consequências aí muito nefastas para o trabalhador! Você estabelece que o trabalhador, para se aposentar, tem que ter 65 anos de idade e, no mínimo, 25 de contribuição, tanto homem, quanto mulher. Só que, no cálculo, eu não dou 100% do salário de benefício. Você pega a média das 80 maiores contribuições e dá um valor, mas eu não dou para ele 100% desse valor. Eu dou 51%. E, depois, vou acrescer 1% para cada ano trabalhado. Isso significa dizer que o trabalhador, para se aposentar com seu salário integral, tem que ter 65 anos de idade e mais 49 de contribuição. Isso é muito cruel! Então, o que vai acontecer: nós trabalhamos em nossos Governos - tanto do Presidente Lula, quanto da Presidenta Dilma - para colocar as nossas crianças na escola. Queríamos o jovem estudando para que tivesse oportunidades de trabalho, com uma formação melhor. Foi um trabalho intenso para evitar que crianças e adolescentes entrassem no mercado de trabalho - ou jovens com uma idade de 15, 16 anos. O que vai acontecer é que esse esforço todo - de Educação, de transformação pela qualificação - vai por água abaixo. Imagine: o cidadão, para ter direito à aposentadoria integral, tem que ter 49 anos de contribuição. Vai ter que começar com 15, 16! Do contrário, não se aposenta nunca. Nunca vai ter o seu benefício integral.   
PHA: Ou seja, nós vamos estimular o trabalho infantil?
CG: Ele não está estimulando, está quase obrigando o trabalho infantil. Porque, se não for isso, a pessoa nunca vai se aposentar com salário integral. É por isso que nós tínhamos uma regra  que levava em conta o tempo de contribuição somado à idade. Quanto mais tempo de contribuição, quanto mais cedo ele entrou no mercado de trabalho, ele poderia reduzir a idade. Isso protege o mais pobre, o menos qualificado, o de menores salários. Lembrando que o trabalhador, hoje, que consegue manter um emprego a vida toda, de estabilidade, é normalmente com os trabalhos mais qualificados, com melhor renda, com organização sindical... Então, esses têm uma certa estabilidade. São os melhores empregos. Os piores empregos são aqueles que o cara perde a cada ano, a cada dois anos, a cada seis meses, e fica  desempregado. Na média, o DIEESE calculou que um trabalhador, durante a vida toda, fica em média sete anos desempregado. Por isso, a grande maioria dos trabalhadores se aposenta por idade. 
PHA: Outra questão que me chama atenção é: o trabalhador rural, que hoje apenas comprova atividade no campo para requerer o benefício aos 60 anos (55 para a mulher), terá de contribuir ao INSS por 25 anos e cumprir a idade mínima de 65. Qual o impacto disso?
CG: Vale dizer, sem exageros, que isso é o fim da aposentadoria do homem do campo. Segurado especial, que é esse atingido pela medida... Quem é o segurado especial? É o pequeno agricultor, que trabalha em regime de economia familiar; o homem, a mulher, os filhos, às vezes um parente que mora junto, enfim, são pequenas propriedades. Essas pequenas propriedades são responsáveis pela produção de mais de 70% dos alimentos que chegam à nossa mesa. As pessoas pensam que o nosso alimento vem latifúndio, mas não vem. O latifúndio produz as commodities, para exportação. O nosso alimento vem do pequeno agricultor. Como é a regra desse pequeno agricultor hoje? Ele contribui com a Previdência, porque quando comercializa a produção, é obrigado a recolher 2,6% do valor dessa comercialização; acontece que, na maioria das vezes, ele não vende direto. A produção dele é comprada por um atravessador. Aí, esse atravessador paga um tributo - que nós chamamos de substituição tributária - à Previdência Social. Então, essa contribuição existe. E ele se aposentava - o homem, aos 60 anos de idade, a mulher, aos 55. Quem conhece o campo como eu, que sou caipira, sabe que as crianças com 10, 12 anos já estão trabalhando. Não é por maldade dos pais; é uma rotina que existe no campo. Vamos colocar que comece aos 15: ainda assim, se ela se aposentar aos 65, vai trabalhar, no mínimo, 50 anos. Sabe o que são 50 anos de sol a sol com uma enxada na mão? Quem fez a regra não conhece o que é o trabalho do campo, não sabe a responsabilidade que ele tem com a nossa alimentação! Esse camponês - e estamos falando do camponês dos rincões do País -, vai ter que parar um dia da sua produção, fazer uma guia de recolhimento para a Previdência e ir ao banco pagar. Você acredita que ele vai fazer isso? Não vai fazer isso! Essa regra inviabiliza a proteção previdenciária do homem do campo. Ele vai estar sem Previdência Social. É uma das mais crueis que têm a PEC.
PHA: Uma contribuição que, a bem da verdade se diga, foi criada pelos regimes militares.
CG: Nós tivemos lá no regime militar a criação de uma proteção que nós, hoje, pretensamente numa Democracia, estamos acabando. É um retrocesso enorme e nós não podemos deixar que isso aconteça.
PHA: Na pensão por morte, a regra estabelece que os proventos deixarão de ser integral e vinculados ao reajuste do salário mínimo. A aposentadoria por invalidez passará a ser proporcional. Qual o efeito disso?
CG: Um casal de velhinhos. O marido é aposentado e ganha um salário mínimo - está nesse universo de mais de dois terços dos nossos aposentados. Se ele morrer, a velhinha vai receber metade de um salário mínimo. Essa regra reduz a renda de milhões e milhões de trabalhadores.
PHA: Mas vai mesmo reduzir à metade?
CG: Vai receber a metade. 50%. E tem mais um ponto, que é o benefício de prestação continuada para idoso, carente e deficiente carente*. Eles mexem também nesse benefício, desvinculam do salário mínimo e atribuem à Lei a fixação de um valor. Então, ele vai poder receber meio salário mínimo, ou um terço de salário mínimo. Eles vão fixar um valor. Não vai ter mais vinculação com o salário mínimo, e vai piorar muito a vida dos deficientes carentes e dos idosos carentes. E sobre o conjunto dos aposentados e pensionistas, ainda, tem uma outra medida que, essa sim, vai reduzir o salário para todo mundo. Todos os aposentados e pensionistas passarão a pagar Previdência. Aposentado vai pagar contribuição previdenciária, também. Hoje não paga. Então, ele vai ter uma redução imediata no valor de seu benefício - para todo o conjunto dos 34 milhões de beneficiários da Previdência. 
PHA: Qual é a diferença central que você mencionaria entre o que vocês estavam, no governo Dilma, planejando para submeter aos trabalhadores em Reforma da Previdência, diante da expectativa de vida do brasileiro, e essa reforma que o Temer apresentou?
CG: Você acompanhou, ainda no governo do presidente Lula, nós instituímos a primeira versão do Fórum Nacional de Previdência. E, em maio de 2015, a presidenta Dilma editou um decreto, preocupada com a sustentabilidade da Previdência. E todos nós temos essa preocupação. Eu já disse isso várias vezes: nós temos um desafio muito grande, que é a transição demográfica. As pessoas estão vivendo mais e estão envelhecendo. Então, nós precisamos, sim, atualizar nossas regras. Mas, como eu disse, a Previdência é uma política tão sensível, tão importante na vida dos trabalhadores, que nenhum governo tem o direito de mandar um pacote de medidas - nesse caso, um "pacote de maldades" - sem discutir com a sociedade. É possível você encontrar soluções que não retirem direitos. Nós vínhamos discutindo, por exemplo, as dívidas dos empresários com a Previdência Social. Ontem, a PGFN (Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional) soltou um estudo que diz que existem R$ 1,8 trilhão de créditos para serem cobrados de 13 mil pessoas físicas e jurídicas. Treze mil - a maioria pessoas jurídicas - devem quase dois trilhões de reais para o Governo. Por que não se cobra essa dívida, ao invés de se retirar direitos dos trabalhadores? Nós estávamos discutindo o pacote de medidas de acelerar cobranças nesses créditos.
PH: Claro.
CG: A PGFN tem que ter melhores condições, a lei tem que ser mudada, para que a gente consiga cobrar esses créditos. Porque hoje da forma  como é, a recuperação de crédito é muito baixa. Pra você ter uma ideia, o índice de recuperação de crédito do nosso mecanismo de cobrança é 0,7%, é muito baixo. Então nós temos que cobrar quem deve e não tirar de quem tem o direito confiscado a duras penas, por isso que a presidenta convocou as centrais sindicais, os empregadores, aposentados e esse conjunto de reitores que tem responsabilidade com a presidência. Então nós vinhamos debatendo, não tínhamos formulado nenhuma proposta concreta, vinhamos fazendo análise dos quadros e nós paramos o golpe que deu quando estávamos discutindo o pacote de cobrança de créditos das empresas devedoras da previdência social.
* O Benefício da Prestação Continuada da Lei Orgânica da Assistência Social (BPC/LOAS) é, hoje, a garantia de um salário mínimo mensal ao idoso acima de 65 anos ou ao cidadão com deficiência física, mental, intelectual ou sensorial de longo prazo, que o impossibilite de participar de forma plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com as demais pessoas.



Fonte:

Conversa Afiada

Paulo Henrique Amorim

O STF trocou a Constituição Federal pelo jeitinho brasileiro. Por Carlos Fernandes



Já faz algum tempo que a nenhum brasileiro é dado mais o direito de se surpreender com as irresponsabilidades de nossas instituições.
Depois que nos transformamos numa pátria sem lei onde os interesses privados se sobreporam aos direitos públicos com a plena anuência dos três poderes, a única garantia estabelecida é a de que já não temos mais garantias nenhuma.
O que se presenciou hoje (7) no plenário do Supremo Tribunal Federal foi o recrudescimento de um estado de coisas que aos olhos de qualquer nação minimamente organizada certamente já seria considerada como um pandemônio institucional.
Chamado a decidir entre a monocracia de um ministro do Supremo sobre um segundo poder e a permanência de um réu na linha sucessória presidencial, a Suprema Corte inovou na sua predisposição à conveniência política.
Sob a humilhação de ter tido um mandado judicial jogado às favas por uma espécie de sultão a quem as leis não são imputáveis, Marco Aurélio Mello descobriu que existem muito mais coisas entre a jurisprudência formada e o interesse econômico do que a nossa vã filosofia pode imaginar.
O que horas antes era tido como uma “vitória acachapante” se transformou melancolicamente numa derrota esmagadora para o ministro relator. A bem da verdade, por 6 votos a 3 o plenário decidiu não ser nem contra nem a favor, muito menos pelo contrário.
Diante do dilema de corroborar com uma maioria já estabelecida no próprio Supremo que impossibilita réus de ocuparem cargos na linha de sucessão da presidência da República ou garantir a tranqüilidade de um governo ilegítimo que eles mesmos ajudaram a colocar, pôs-se em prática uma terceira via.
Para o delírio dos golpistas, chegou-se à conclusão que Renan Calheiros permaneceria no cargo sem, porém, poder substituir o presidente da República no caso de ausência deste e do presidente da Câmara.
É uma aberração jurídica. Um jabá, se preferir.
Com esse novo entendimento criado ao gosto do freguês, não sem alguma razão o nosso querido Eduardo Cunha poderá se sentir de alguma forma injustiçado. Afinal, se um réu como Renan pode ser presidente do Senado, o que impede que um réu como Cunha seja presidente da Câmara?
Eis o caos em que nos encontramos. À medida que trocamos a Constituição Federal pelo velho “jeitinho” brasileiro de acomodar as coisas, saímos do campo da decência para adentrarmos no lodo da imoralidade.
Alguém já havia dito, é justamente pelo “jeitinho” brasileiro que o Brasil não tem mesmo jeito.

Fonte:
DCM- Diário Centro do Mundo
Sobre o Autor

Economista com MBA na PUC-Rio, Carlos Fernandes trabalha na direção geral de uma das maiores instituições financeiras da América Latina.


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CHICO BUARQUE " COTIDIANO "

NÃO CONSIGO MAIS ACOMPANHAR 2016, VOU ESPERAR A VERSÃO EM DVD...
Hoje é o dia da justiça. Só se for divina pq no Brasil...


Apesar de você - Chico Buarque


É preciso ter força, ter raça, ter gana, ter sonho, ter fé na vida..

Elis Regina

Mas é claro que o sol, vai voltar amanhã, mais uma vez eu sei ...


Ainda hoje, sejas  sol...

Brilhe;
Irradie luz;
Desfaça as trevas;
Ilumine;
Ilumine-se;


Elis Regina - Maria Maria

As coisas mais insignificantes têm, às vezes, maior importância e é geralmente por elas que a gente se perde.” 

O Coração Risonho


A tua vida é a tua vida
Não a deixes ser dividida em submissão fria.
Está atento
Há outros caminhos,
Há uma luz algures.
Pode não ser muita luz mas
vence a escuridão.
Está atento.
Os deuses oferecer-te-ão hipóteses.
Conhece-las.
Agarra-las.
Não podes vencer a morte mas
podes vencer a morte em vida, às vezes.
E quanto mais o aprendes a fazê-lo,
mais luz haverá.
A tua vida é a tua vida.
Memoriza-o enquanto a tens.
És magnífico.
Os deuses esperam por se deliciarem
em ti.

Charles Bukowski
“Outro dia, fiquei pensando no mundo sem mim.
Há o mundo continuando a fazer o que faz.
E eu não estou lá. Muito estranho. Penso
no caminhão do lixo passando e levando o lixo
e eu não estou lá. Ou o jornal jogado no jardim
e eu não estou lá para pegá-lo. Impossível.
E pior, algum tempo depois de estar morto, vou ser
verdadeiramente descoberto. E todos aqueles
que tinham medo de mim ou me odiavam
vão subitamente me aceitar. Minhas palavras
vão estar em todos os lugares. Vão se formar
clubes e sociedades. Será nojento.
Será feito um filme sobre a minha vida.
Me farão muito mais corajoso e talentoso do que
sou. Muito mais. Será suficiente para fazer
os deuses vomitarem. A raça humana exagera
em tudo: seus heróis, seus inimigos, sua importância.”




O mundo chora



O mundo chora...
A falta de amor;
A ganância desmedida;
A incompreensão;
A corrupção;
A truculência;
A vingança;
A fome dos irmãos mais infelizes;
A destruição da natureza;
A discórdia nos lares;
A doença;

O mundo chora  sofrimento e solidão...