Uso irresponsável de antimicrobianos está criando superbactérias
resistentes a todos os fármacos
“Morrerão 10 milhões de pessoas a cada ano”, adverte William Hall. “
Os riscos são muito grandes para ignorá-los”,
sentencia. Hall é um dos autores de um relatório sobre a resistência a antibióticos que pôs
em alerta as autoridades europeias. O documento, elaborado para o Governo britânico, afirma que se não forem tomadas medidas urgentes
em 2050 morrerão mais pessoas vítimas de superbactérias –
mutantes e imunes a qualquer fármaco conhecido – que de câncer (8,2 milhões de
mortes) ou de acidentes de trânsito (1,2 milhão).
A origem do problema não está nos micróbios, mas nas pessoas:
médicos, veterinários, farmacêuticos, criadores de gado, pacientes. O uso
indiscriminado e irresponsável de antibióticos está propiciando o surgimento de
cepas de bactérias multirresistentes como a Klebsiella pneumoniae, “com uma letalidade superior a 50%, similar à do último
surto de ebola, mas sem gerar atenção midiática”, segundo a médica Pilar Ramón,
assessora da Organização
Mundial da Saúde (OMS).
A farmacologista Belén Crespo, diretora da Agência Espanhola
de Medicamentos e Produtos Sanitários, destacou na sexta-feira um acordo
alcançado com o setor nacional de suínos para “a redução voluntária” do uso de
colistina, um antibiótico de importância crítica para a saúde humana. Os criadores utilizam o fármaco em larga escala para
prevenir infecções e promover o crescimento dos porcos.
A colistina também é usada em humanos como tratamento de
última linha contra micróbios multirresistentes, como Klebsiella pneumoniae, Acinetobacter baumannii e Pseudomonas aeruginosa, responsáveis por infecções com alta mortalidade.
O uso irresponsável de antibióticos para
animais não se reduz ao gado, como observou o veterinário Salvador Cervantes, membro do Grupo de Estudo de Medicina Felina na
Espanha. Cervantes denunciou “um excesso de prescrição de antibióticos” nas
clínicas de pequenos animais, por ignorância, para cumprir os objetivos
comerciais dos gerentes, para satisfazer os donos ou “por pressão dos
laboratórios, que também existe”.
“Nosso posicionamento é que os veterinários
devem receitar o mínimo possível de antibióticos, a fim de evitar seu uso
inapropriado, e na medida necessária para garantir aos animais um tratamento
eficaz”, declarou em um comunicado Félix Hernáez, diretor-geral para o sul da
Europa da Zoetis, a primeira empresa de saúde animal do mundo, com ganhos
anuais de 4,8 bilhões de dólares. A indústria apoia o site Vetresponsable,
para promover o “uso responsável dos medicamentos veterinários”.
A assessora da OMS Pilar Ramón também
fez um apelo para “resistir às pressões e incentivos da indústria farmacêutica
para prescrever antibióticos quando não são indicados”, sobretudo através de
“campanhas agressivas de introdução de novos produtos” em países em desenvolvimento.
Ramón expôs “os três p de pressão sobre os profissionais da saúde: pais,
pacientes e pharma”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário